O fruto não cai longe do pé

As novas gerações não são tão diferentes de nós

Ana Copic
2 min readJan 17, 2023

Todas as vezes que digo ensinar arte marcial, recebo os mesmos olhares surpresos e curiosos. Apesar de que chutar crianças seria a profissão dos sonhos, estar em tatame com elas envolve mais conhecimento de didática do que da luta propriamente dita. Conviver com pessoas pequenas é educá-las em certo grau, e isso exigiu de mim observar com mais atenção como elas se comportam.

Em uma das primeiras aulas que ministrei, lidei com um garotinho de cinco anos que se divertia muito com as dinâmicas que usei em aula. Satisfeita com o desempenho dele, modéstia à parte com o meu também, liberei para tomar água. Perto da garrafinha dele, esperavam sentados alguns alunos mais velhos, vidrados nos seus joguinhos de smartphone. Como uma mosca atraída pelo brilho da lâmpada, o menino se esqueceu da água e lentamente se aproximou das telas coloridas.

Embora qualquer aula dificilmente seja mais interessante do que entretenimento, nos dias seguintes percebi um padrão: as crianças não carregam mais gibis ou bonecas, mas sim tablets e celulares. Um estudo da Mcafee divulgou em maio que o Brasil é o país com maior exposição de jovens e crianças a aparelhos eletrônicos no mundo. Imagino que, durante o isolamento social em 2020, os pais estavam mais preocupados em colocar comida na mesa do que policiar o divertimento de seus filhos. Isso resultou em uma massa de crianças que tornou as telinhas suas melhores amigas.

No entanto, uma das coisas que notei é: crianças aprendem por meio da imitação. As famílias que tanto reclamam do vício eletrônico de seus filhos são as mesmas que ficam mais tempo usando redes sociais do que brincando com eles. A tão fértil imaginação infantil foi demitida em favor dos conteúdos prontos e superficiais das plataformas digitais.

Finalmente, essas mesmas crianças têm sido cada vez mais cobradas academicamente. Bem, creio ser inútil esperar excelência escolar daqueles que têm crescido vendo seus genitores se interessarem mais pela harmonização facial da blogueira do momento do que por tempo de qualidade com sua família. Afinal, qual geração progrediu sem um mísero esforço da antiga?

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Ana Copic

Estudante de jornalismo vivendo histórias para contar. Ou uma grande intrometida, como preferir.